Paz e Bem!
Nós, da Conferência da Família
Franciscana do Brasil e Conferência dos Religiosos do Brasil, Regional Minas
Gerais, nos solidarizamos com todos os nossos irmãos e irmãs vitimadas pela tragédia
ocorrida no Distrito de Bento Rodrigues (Mariana) e ao longo do Rio Doce e, a
um só tempo, expressamos nossa indignação diante deste triste fato. Esta tragédia
não foi um acidente e muito menos uma fatalidade.
Sabemos que as Mineradoras há anos
vêm demonstrando uma ganância desenfreada, capaz de literalmente ‘devorar’
nossas montanhas e a vida de tantas pessoas. Essas montanhas são coincidentemente
as guardiãs de nossos aquíferos. Assim, essa atividade, quando não causa
desmoronamentos nas barragens de rejeitos, como esse ocorrido, silenciosamente
seca inúmeros aquíferos, comprometendo bacias hidrográficas inteiras, com seus
ecossistemas e comunidades. Em troca, somam lucros exorbitantes, ano após ano,
como o acumulado pela Samarco, na ordem de R$ 7 bilhões, somente em 2014.
Com um discurso de
desenvolvimento e progresso, iludem com falsas promessas os pobres, invadem
seus territórios, muitos deles habitados por centenas de anos. Destroem modos
de vida e maneiras tradicionais de conhecimento e sobrevivência, a qual fica
comprometida pela devastação de matas e rios – morte de peixes, diminuição da
água necessária à dessedentação de animais domésticos e seres humanos.
São graves os prejuízos para a
saúde das populações causados pela poeira e contaminação do solo mediante o uso
de substâncias tóxicas e cancerígenas como o Arsênio, Amônia, Ácido Cianídrico,
Mercúrio, entre outros. Há relatos comoventes de pessoas que teimam em
conservar o que é seu por direito e se veem intimidados a vender sua
propriedade para as mineradoras. Essas comunidades inocentes são expulsas de
suas terras com extrema brutalidade policial, que age contra o povo, em nome do
Estado.
Muitos políticos, em diferentes
esferas de governo, envolvem-se em negociatas, deixando-se patrocinar por
dinheiro escuso em suas campanhas. Vendem-se e vendem a riqueza que não lhes
pertence, na calada da noite.
O mundo é nossa Casa Comum, não
pode ser apropriado por poucos em nome de um modo de produção, distribuição e
consumo concentrador da riqueza e do poder, que exclui de forma violenta, a
maioria pobre.
Em nome da Família Franciscana e
do Religiosos e Religiosas de Minas Gerais, expressamos nosso repúdio à barbárie
acontecida em Mariana, causada pela empresa Samarco, pertencente ao grupo Vale
e à australiana BHP Billiton.
Repudiamos acordos financeiros
que ferem a dignidade de nosso povo, em função de alcançar o poder ou
consolidar-se nele. Em nome do nosso povo sofredor e dizemos BASTA de mentiras,
de falsidades, de ironias, de arrogâncias, de prepotências, de ganância.
Os bispos da América Latina,
reunidos em Aparecida do Norte (2007) assim se expressaram: “nas intervenções sobre os recursos
naturais, não predominem os interesses de grupos econômicos que arrasam
irracionalmente as fontes da vida” (n. 471).
Em sua recente encíclica sobre o
meio ambiente, o Papa Francisco exorta que “os
poderes econômicos continuam a justificar o sistema mundial atual, onde predomina
uma especulação e uma busca de receitas financeiras que tendem a ignorar todo o
contexto e os efeitos sobre a dignidade humana e sobre o meio ambiente. Assim
se manifesta como estão intimamente ligadas a degradação ambiental e a
degradação humana e ética” (Laudato Si, 56).
Minas Gerais e o Brasil precisam
urgentemente fazer uma transição desse modelo econômico, dependente de commodities, para uma economia de base
solidária, verdadeiramente sustentável, com uma política ambiental séria e
verdadeiramente comprometida com a vida e não somente o lucro.
Somos um estado com enorme
potencial turístico e agroecológico. Podemos pensar em um “decrescimento”
econômico com melhoria da qualidade de vida. É nosso único caminho, pois o
modelo econômico atual possui uma lógica infinita de produção e consumo, em um
planeta com recursos finitos. Quando vamos realmente colocar o limite dos
recursos naturais em evidência? Quando toda água disponível acabar? Estamos
enfrentando uma grave e profunda crise hídrica que vai se intensificar muito nos
próximos anos. Toda a excessiva demanda pelos recursos hídricos para a mineração
e agropecuária, somada às Mudanças Climáticas, está comprometendo
definitivamente nosso acesso à água. A mudança do clima está em curso, é
inexorável e irreversível, de acordo com Painel Intergovernamental sobre
Mudanças Climáticas. Os modelos mais modernos de cenários climáticos apontam
uma redução considerável das chuvas no sudeste e nordeste do país. Neste
cenário é preciso cuidar dos nossos aquíferos e áreas de recarga hídrica, e não
entregá-los à exploração econômica. Sem água não existe economia.
Aproveitamos ainda para expressar
nossa reprovação à PL 2946/2015, que concentra poderes no Executivo Estadual e
exclui a sociedade civil, dos debates sobre licenciamento ambiental.
Queremos um povo livre, com direito
de viver neste mundo como sujeito e não como objeto. Todos nós temos o direito
de viver livremente, com a responsabilidade de cuidar de Nossa Casa Comum, com carinho,
amor, respeito, promovendo a justiça, a verdade e a paz.
Se os Senhores, Governador e
demais autoridades são realmente representantes do povo e que defendem a Vida e
a luta pelos pobres, tenham coragem de dizer NÃO a esta triste realidade. Como
disse Jesus: "O que vale o ser humano ganhar a vida e perder a própria
alma?" (Mc 8,35). Posicionem-se a favor das vítimas, não de seus algozes.
Senhor Governador e autoridades,
escutem o clamor do povo e não se deixem enganar pelos lobos travestidos de
cordeiros. Não se vendam, não compactuem. Agora é a hora de testemunhar que
somos a favor da vida e não da morte, que este governo tem de fato um
diferencial.
Evocando, por fim, São Francisco
de Assis, patrono de todos os que se dedicam às questões ambientais, nos
despedimos relembrando a oração a ele atribuída:
Onde
houver desespero, que eu leve a esperança;
Onde
houver tristeza, que eu leve a alegria;
Onde
houver trevas, que eu leve a luz.
Fraternalmente,
Frei Vicente
Ronaldo da Silva, ofm
Presidente da Conferência
da Família Franciscana de Minas Gerais.
Frei Oton da Silva
Araújo Júnior, ofm
Da Equipe de
Coordenação da Conferência dos Religiosos do Brasil, MG
Belo Horizonte, 13
de novembro de 20015.
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